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Novo dispositivo cerebral é o primeiro a transformar o pensamento em fala e escrita; entenda

Por Agência O Globo - 15/08/2025
Novo dispositivo cerebral é o primeiro a transformar o pensamento em fala e escrita; entenda
Cérebro. (Foto: Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil.)

Neurocientistas desenvolveram recentemente implantes cerebrais que podem transformar sinais neurais diretamente em palavras inteiras. Chamadas de interfaces cérebro-computador (ICCs), elas exigem, em grande parte, que os usuários tentem falar fisicamente — e isso pode ser um processo lento e cansativo.

Porém, isso está prestes a mudar. Um novo dispositivo em próteses permite que os usuários se comuniquem simplesmente pensando no que querem dizer.

O dispositivo funciona do mesmo modo que os já disponíveis, utilizando sensores implantados em uma parte do cérebro chamada córtex motor, que envia comandos de movimento ao trato vocal. A ativação cerebral detectada por esses sensores é então inserida em um modelo de aprendizado de máquina para interpretar quais sinais cerebrais correspondem a quais sons para cada usuário. Em seguida, esses dados são usados para prever qual palavra o usuário está tentando dizer.

Mas o córtex motor não se ativa apenas quando tentamos falar, ele também está envolvido, em menor grau, na fala imaginada. E é neste quesito que o novo dispositivo se diferencia.

Os pesquisadores estudaram três pessoas com esclerose lateral amiotrófica (ELA) e uma com um derrame cerebral, todas as quais já haviam implantado os sensores. Usando esse novo sistema de "fala interior", os participantes precisavam apenas pensar em uma frase que queriam dizer e ela aparecia em uma tela em tempo real.

Enquanto os decodificadores anteriores da fala interior eram limitados a apenas algumas palavras, o novo dispositivo permitiu que os participantes extraíssem informações de um dicionário de 125.000 palavras.

“Como pesquisadores, nosso objetivo é encontrar um sistema que seja confortável [para o usuário] e que, idealmente, alcance uma capacidade naturalista”, afirma a autora principal Erin Kunz, pesquisadora de pós-doutorado que desenvolve próteses neurais na Universidade Stanford.

Dispositivos de fala, como o utilizado no estudo, exigem que os usuários inspirem como se estivessem realmente dizendo as palavras. Mas, devido à dificuldade para respirar, muitos usuários precisam respirar várias vezes para completar uma única palavra com esse método.

Com a nova tecnologia, os participantes do estudo conseguiram se comunicar a uma taxa de conversação confortável de cerca de 120 a 150 palavras por minuto, sem mais esforço do que o necessário para pensar no que queriam dizer.

Especialistas afirmam que, na fala típica, a pessoa começa com uma ideia do que quer falar, essa ideia é traduzida em um plano de como mover seus articuladores [vocais] e esse plano é enviado aos músculos propriamente ditos para serem executados.

Porém, em muitos casos entre pessoas com problemas de fala, não conseguem concluir essa primeira etapa e o novo dispositivo só funciona se as pessoas conseguirem converter a ideia geral do que querem dizer em um plano de como dizê-lo.

Segundo Kunz, os quatro participantes da pesquisa estão entusiasmados com a nova tecnologia. "Em geral, [havia] muita empolgação com a possibilidade de se comunicarem rapidamente novamente", diz.

Para a pesquisadora, esse estudo é particularmente pessoal.

"Meu pai tinha ELA e perdeu a capacidade de falar. Eu meio que me tornei sua tradutora pessoal de fala perto do fim da vida dele, já que eu era praticamente a única que conseguia entendê-lo. É por isso que eu pessoalmente conheço a importância e o impacto que esse tipo de pesquisa pode ter”, explica.

Para garantir que os pensamentos privados permanecessem privados, os pesquisadores implementaram uma frase-código: "chitty chitty bang bang". Quando falada internamente pelos participantes, isso fazia com que o dispositivo parasse de escrever.

Implantes de leitura cerebral inevitavelmente levantam preocupações sobre privacidade mental, porém, os pesquisadores e especialistas dizem não estarem preocupados com o uso indevido ou o desenvolvimento imprudente da tecnologia e falam da integridade dos grupos de pesquisa envolvidos na pesquisa de próteses neurais, citando médicos que querem resolver o problema de centenas de milhares de pessoas.

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