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Barroso diz que julgamento que condenou Bolsonaro 'encerra o ciclo do atraso': 'Que possamos pacificar o país'

O presidente do Supremo Tribunal Federal (), Luís Roberto Barroso, afirmou ao fim do julgamento da trama golpista que a análise do caso "encerra o ciclo do atraso". Ele também elogiou o ministro , relator do caso.
— Fez um trabalho hercúleo. Julgamento foi um divisor de águias, Estamos encerrando o ciclo do atraso. Que possamos pacificar o país.
Como foi o julgamento
Por 4 votos a 1, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu condenar o ex-presidente e aliados pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado. Os votos pela condenação foram dados pelos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Alexandre de Moraes, relator do caso, enquanto defendeu a absolvição. É a primeira vez que um ex-presidente é condenado por tentativa de golpe de Estado na História do país.
Após a condenação, os ministros passaram à fase da dosimetria, quando discutirão as penas que serão aplicadas aos réus.
A Primeira Turma definiu uma pena de 27 anos e 3 meses ao ex-presidente.
Além de Bolsonaro, foram condenados:
Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, a 24 anos;
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, a 24 anos;
Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, a 21 anos;
Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, a 2 anos de prisão, já que fez delação premiada;
Paulo Sérgio Nogueira, e o ex-ministro da Defesa, a 19 anos;
Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, a 26 anos;
Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin (neste caso, menos por dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado)
A maioria pela condenação foi formada com o voto de Cármen Lúcia, a primeira a se manifesta na sessão desta quinta-feira. A ministra afirmou entender que há "prova cabal" que um grupo liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro tentou dar um golpe no país. Segundo ela, as provas reunidas na investigação comprovam a "materialidade" de que houve violência e grave ameaça às instituições do país.
Antes de entrar no mérito da ação, a ministra rejeitou pedidos das defesas de réus, como a alegação de cerceamento de defesa, a incompentência do STF para julgar o caso e a anulação da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid.
Ao tratar da questão de qual a instância adequada para julgar a ação penal com réus que não tenham prerrogativa de foro, Cármen Lúcia afirmou que mantém seu entendimento desde 2007 de que a Corte tem competência para casos relacionados a pessoas que tiveram prerrogativa de foro. A ministra citou que seu posicionamento já era assim na ação relativa ao mensalão.
— Seria um casuísmo gravíssimo e quebraria o princípio da igualdade na aplicação que alguns (réus) fossem julgados depois da mudança (do regimento sobre a competência do STF para julgar ação penal, em março de 2025) com fixação das competências que nós já exercemos numerosíssimas vezes.
Antes de entrar no voto em si, Cármen fez algumas considerações sobre o papel dos juízes de julgarem todos os casos dando a mesma importância. Segundo ela, a ação penal da trama golpista "é um encontro com seu passado, seu presente e seu futuro".
— Toda ação penal, especialmente a presente ação penal, impõe julgamento justo e aqui não é e aqui não é diferente. O que há de inédito talvez nesta ação penal é que nela pulsa o Brasil que me dói. A presente ação penal é quase o encontro do Brasil com o seu passado, com o seu presente, e com o seu futuro, mas na área especificamente das políticas públicas, dos órgãos de estado.
Voto de Zanin
Após Cármen, o ministro Cristiano Zanin iniciou seu voto, em que tambepm apontou entender estar configurada a tentativa de golpe.
— A estabilidade da organização, e o próprio direcionamento das ações antes e depois das eleições de 2022, revela a continuidade do projeto em torno do escopo maior da organização, que era a manutenção de grupo específico no poder, independentemente da vontade popular — afirmou ele.
O ministro destacou que os atos de 8 de janeiro, com as invasões das sedes dos Poderes, depredação do patrimônio da União, confrontos com policiais e jornalistas, configuram violência inequívoca, com o objetivo de criar instabilidade para justificar medidas de exceção.
— A ação dos executores tinha como escopo demonstrar elevado grau de instabilidade política, a ponto de justificar decretos de exceção — disse Zanin.
Para o ministro, Bolsonaro pode se responsabilizado pelo 8 de janeiro porque há uma "relação de causalidade" entre os seus discursos e os atos golpistas:
— Não há como afastar a evidente correlação entre a narrativa construída pelo grupo e reiterada constantemente pelo seu líder, Jair Messias Bolsonaro, e aglutinação de manifestantes que, estimulados por integrantes do grupo, vieram a provocar posteriormente as ações do 8 de janeiro. O dolo e a relação de causalidade são suficientes para impor a responsabilização do acusado.
Recados a Fux
A sessão desta quinta-feira, a quinta de julgamento, foi marcada por recados a Fux, que na véspera havia dado um longo voto, de 11 horas e meia de duração, rebatendo diversos pontos da denúncia e do voto do relator. Além de Cármen, Dino, Zanin e o próprio Moraes fizeram comentários para rebater os argumentos do colega, evidenciando seu isolamento na Turma.
Em uma longa intervenção ao voto de Cármen, Moraes chegou a exibir um vídeo no plenário com um discurso de Bolsonaro em setembro de 2021, no qual o então presidente fez ameaças a ele e a Fux, que na época presidia o STF:
— Nós não podemos continuar a aceitar uma pessoa específica da região da Praça dos Três Poderes continue barbarizando nossa população. Não podemos aceitar mais prisões políticas no nosso Brasil. Ou o chefe desse poder (Fux) enquadra o seu (Alexandre de Moraes), ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos, porque nós valorizamos, reconhecemos e sabemos o valor de cada poder da República — disse Bolsonaro em comício durante ato na Avenida Paulista, em São Paulo.
Moraes rebateu ainda diretamente os argumentos de Fux, que criticou em seu voto o encadeamento de fatos apresentado pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Na quarta-feira, ao votar pela absolvição de Bolsonaro, Fux citou a reunião dos "kids pretos" em um prédio em , desqualificando a prova trazida pela Polícia Federal.
— Se nós pegarmos, ministro Flávio, um fato isolado...A reunião dos kids pretos, que na verdade, foi um salão de festas fechado. "Mas a reunião dos kids pretos, eles não podem se reunir?" A questão é o encadeamento (dos fatos) — disse Moraes.
Fux defendeu inocência de Bolsonaro
Em um voto que durou 11 horas e meia, Fux abriu divergência na Primeira Turma ao votar para absolver Jair Bolsonaro na trama golpista. Com isso, o placar do julgamento está em 2 a 1 pela condenação do ex-presidente. Alexandre de Moraes, relator da ação penal, e Flávio Dino, votaram por punir todos os oito réus da ação penal.
O voto de Fux representou uma reviravolta no entendimento do ministro. Embora tenha adotado divergência pontuais em relação às penas aplicadas a envolvido nos atos golpistas do 8 de Janeiro nos últimos meses, até então o magistrado vinha concordando com a condenação dos réus.
Apesar de absolver Bolsonaro e os demais réus, Fux , delator da trama golpista, pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado de Direito.
Ao analisar o caso de Bolsonaro, Fux argumentou que culpar ex-presidente por golpe de Estado abriria precedente perigoso para responsabilização de políticos. Ele afastou a relação do ex-chefe do Palácio do Planalto com os atos antidemocráticos de 8 de Janeiro.
— Como com base em alegações genéricas de abuso de suas prerrogativas e de prerrogativas gerências indevidas nas funções dos outros poderes — afirmou o ministro. — Não se pode aceitar a pretensão acusatória de se imputar ao réu a responsabilidade por crimes cometidos por terceiros no fatídico 8 de janeiro de 2023 como decorrência de discursos e entrevistas ao longo do mandato — disse ele.
O ministro entendeu que não cabe condenar Bolsonaro por tentativa de golpe por ações tomadas quando ele ainda estava no cargo de presidente da República. Segundo o ministro, não seria possível ele tentar depor o próprio governo.
Argumentou, ainda, entender que os ataques de Bolsonaro feitos às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral do país "não configuram tentativa de abolição do estado democrático de direito".
— Ainda que se tenham questionamentos contra a regularidade do sistema de votação ou acusação aos membros de outros poderes, a simples defesa da mudança do sistema de votação não pode ser considerada narrativa subversiva.
Fux afirma que não há provas de que o plano Punhal Verde e Amarelo, que previa o assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Moraes, tenha sido apresentado a Bolsonaro. A Polícia Federal apontou que o plano foi impresso no Palácio do Planalto por um auxiliar do então presidnte, que foi em seguida ao Palácio da Alvorada. Em um segundo momento, foi impresso novamente no Planalto, em um momento em que o ex-presidente também estava lá.
— As provas apresentadas pela acusação são insuficientes para demonstrar, afastando qualquer dúvida razoável, que essa minuta, em algum momento, chegou a ser apresentada ao réu Jair Bolsonaro, muito menos que tenha contado com a sua anuência.
Antes de votar por absolver Bolsonaro, Fux divergiu dos colegas em relação a pedidos apresentados pelas defesas dos réus e aos crimes imputados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) na denúncia. Ele defendeu, por exemplo, a nulidade do processo por entender a incompetência do STF para julgar a ação penal. O ministro também votou para que os crimes de tentativa de golpe de Estados e de abolição de Estado de Direito sejam incorporadas em uma só conduta. Na prática, esse entendimento, caso seja aceito pela maioria, pode reduzir a pena dos condenados.
Defesa de Bolsonaro
A defesa de Bolsonaro afirmou no julgamento que não há "uma única prova" da participação dele na trama golpista e negou vinculação com o plano que previa o assassinato de autoridades e os atos de 8 de janeiro. O advogado Celso Vilardi também criticou a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, e questionou a existência da minuta golpista apontada pela investigação.
— Não há uma única prova que atrele o presidente a Punhal Verde e Amarelo, a Operação Luneta e a 8 de janeiro. O presidente (Bolsonaro) não atentou contra o Estado democrático de Direito. Não tem absolutamente nada a ver com o 8 de janeiro.
Votos de Moraes e Dino
Os ministros Alexandre de Moraes, relator da ação, e Flávio Dino foram os primeiros a apresentarem seus votos, pela condenação de todos os réus. Dino, contudo, afirmou ver participação de menor importância em relação ao deputado federal Alexandre Ramagem e aos ex-ministros Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, indicando que defenderá penas menores para eles.
Antes dele, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF), . A definição das penas de cada um será feito numa segunda etapa do julgamento, após os votos dos ministros.
Dino, porém, se antecipou à discussão ao defender uma pena menor para os ex-ministros e generais Paulo Sérgio Nogueira e Augusto Heleno e o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin.
— Quando for o momento da dosimetria, eu considerarei a participação dele como de menor importância — afirmou Dino, ressaltando que neste ponto diverge do ministro relator Alexandre de Moraes. Segundo o ministro, houve uma "menor eficiência causal" nas provas levantadas contra os três réus.
Em contrapartida, Dino votou pela pena maior para o ex-presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro e general Braga Netto por serem os "coordenadores" e "arquitetos" do plano golpista. Ele também viu um envolvimento maior do ex-ministro Anderson Torres, do almirante Almir Garnier e do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, com a ressalva de que este último deve ter um abatimento da pena em razão do seu acordo de delação premiada.
No início da leitura do seu voto, Dino afirmou que a Constituição não permite "anistia" a condenados por crimes contra a democracia. A declaração é um recado direto ao Congresso, que discuta uma proposta de anistia a investigados e condenados pelos atos de 8 de janeiro.
— Esses tipos penais são insuscetíveis de anistia, de modo inequívoco. Jamais houve anistia feita em proveito dos altos escalões do poder. Nunca a anistia se prestou a uma espécie de autoanistia de quem exercia o poder dominante — disse Dino, ao relembrar precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) e votos recentes de ministros como Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.
Antes de iniciar o voto em si, o ministro rebateu críticas de aliados de Bolsonaro de que o julgamento da Corte tem viés políticos.
— Não há no voto recados, apenas análise dos autos, O Supremo já julgou políticos de diversos partidos. Julgou o mensalão. Esse tribunal negou habeas corpus ao atual presidente Luiz inácio Lula da Silva — disse Dino. — Quando o árbitro de futebol marca o pênalti para o meu time, ele é o melhor do mundo. Se ele marca para o outro time, é o pior. Só que o árbitro é o mesmo e as regras são as mesmas. Não há julgamento de uma posição política A ou B.
Dino tem se alinhado ao relator nos processos relacionados aos atos golpistas. Ao iniciar seu voto, Moraes afirmou "não haver nenhuma dúvida de que houve tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito" liderada por Bolsonaro e listou episódios que considerou como "atos executórios" da conduta criminosa.
O ministro Luiz Fux, único a não acompanhar os entendimentos do relator no colegiado ao longo do processo, a Moraes no julgamento. Ele será o terceiro a apresentar seu voto, logo após o ministro Flávio Dino, próximo a se manifestar.
Ao proferir seu voto, Moraes considerou que Bolsonaro foi o "líder da organização criminosa" que tentou permanecer no poder após a derrota eleitoral de 2022.
— O réu Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa, e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder, conforme fartamente demonstrado nos autos — disse Moraes.
Veja os destaques do voto de Moraes no julgamento da trama golpista:
Para Moraes, a estratégia do grupo criminoso consistiu na divisão de tarefas e na prática de uma sequência de atos executórios "com claro objetivo de abolir o Estado Democrático de Direito".
O ministro citou em seu voto declarações de Bolsonaro nas quais o ex-presidente afirmou que só havia três possibilidades de ele deixar a Presidência: "preso, morto ou vitorioso". "Quero dizer aos canalhas que nunca serei preso", disse na ocasião o então chefe do Palácio do Planalto.
Segundo o Moraes, esse trecho da entrevista do Bolsonaro é uma prova de que ele jamais aceitaria uma derrota nas urnas.
— O líder desses grupo criminoso aqui deixa claro de viva voz, de forma pública, para toda a sociedade, que jamais aceitaria uma derrota nas urnas — disse o relator.
O ministro apontou que os fatos levantados pela Polícia Federal ao longo das investigações mostram que a tentativa de golpe não se limitou a simples discussões ou "conversa de bar", como alegaram as defesas, mas que configuram atos executórios das condutas criminosas. Ele citou que havia um mesmo modus operandi do grupo, com ataques às urnas eletrônicas e descredibilização das instituições, como forma de se criar um discurso para a tentativa de golpe.
Moraes afirmou que após o segundo turno das eleições houve "tantos" atos executórios que muitas pessoas acabam esquecendo de todos.
— (Tivemos) O aumento desses atos executórios. Foram tantos, e tão absurdos, que vários nós acabamos esquecendo. Nós tivemos atos executórios violentíssimos, das infrações penais imputadas pela Procuradoria-Geral da República, após o segundo turno.
Entre eles, o ministro citou o monitoramento e o plano de matar ele próprio e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a tentativa do PL de anular parte dos votos do segundo turno de 2022.
— Tivemos ações de monitoramento de autoridades, de ministros do Supremo, inclusive desse relator, ação de monitoramento do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. Tivemos uma absurda representação eleitoral para verificação extraordinária em que se pedia, pasmem, se pedia para anular somente os votos de 48% das urnas eletrônicas no segundo turno.
Ele também citou correlação de uma "live" realizada por Bolsonaro em julho de 2021, com anotações em uma agenda do general Heleno e documentos apreendidos em computadores de Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
— (Na live) Já se mostrava a unidade de desígnios para ao mesmo tempo descredibilizar a Justiça Eleitoral e o Poder Judiciário como um todo e, do outro, o apoio das Forças Armadas. (A intenção) era mostrar à parcela da sociedade que poderia afastar o Judiciário, porque esse grupo criminoso tinha apoio das Forças Armadas — disse ele. — No Brasil, toda vez que as Forças Armadas acolheram um chamamento de um grupo político que se diz representante do povo nós tivemos um golpe, um estado de exceção, uma ditadura — completou.
O voto de Moraes foi acompanhado por uma sequência de slides, em que pontuou seu entendimento sobre as acusações sobre cada um dos réus. Ele começou pelo caso do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno.
— Não é normal um ministro do GSI ter uma agenda com anotações golpistas — disse Moraes.
Moraes ressaltou que apenas a tentativa já configura os crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito:
— Não confundamos a consumação do golpe com consumação do crime de golpe de Estado. São coisas diversas. O crime de golpe de estado e o crime de abolição do Estado Democrático de Direito tem como elementares do tipo “tentar”. A mera tentativa, até porque a consumação não vai possibilitar a responsabilidade de ninguém, a tentativa consuma o crime — disse o ministro.
O que está em discussão
De acordo com a PGR, foi arquitetado um complô para reverter o resultado da eleição, contrariando a Constituição, para manter Bolsonaro no poder. A investida só não teria ido adiante, mesmo com apoio de alguns militares, porque os então comandantes do Exército, Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, rejeitaram colocar as tropas à disposição do ex-presidente. O processo também representa um marco para a caserna, porque pode levar pela primeira vez à prisão de integrantes das Forças Armadas por atentado à democracia.
“Todos eles convergiram, dentro do seu espaço de atuação possível, para o objetivo comum de assegurar a permanência do presidente da República da época no exercício da condução do Estado, mesmo que não vencesse as eleições”, escreveu o procurador-geral da República, Paulo Gonet, em sua manifestação final. Os réus negam as acusações.
Quem são os réus
Além de Bolsonaro, são julgados os ex-ministros Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres e Paulo Sérgio Nogueira; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier; o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); e o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência e delator da trama golpista.
Aspectos políticos
Além dos aspectos jurídicos, antes mesmo da condenação de Bolsonaro, aliados do ex-presidente haviam acelerado as discussões sobre a candidatura da direita em 2026. Dirigentes do Centrão incentivam o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, a entrar na disputa, movimento refutado pelo deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Publicamente, Tarcísio mantém o discurso de candidato à reeleição, mas aliados veem movimentos para se posicionar nacionalmente, como as articulações pelo projeto da anistia.
Outros candidatos da direita vêm ensaiando ocupar o espaço deixado por Bolsonaro, que, apesar de estar inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vinha mantendo a pretensão de ser candidato. Em caso de condenação, além da extensão da sua proibição de concorrer nas urnas, o ex-presidente ficará preso cumprindo pena, o que o impedirá de fazer campanha nas ruas.
Nesse cenário, os governadores Ronaldo Caiado, de Goiás, e Romeu Zema, de Minas Gerais, se anteciparam em lançar suas pré-candidaturas, enquanto Ratinho Júnior, do Paraná, corre por fora. Integrantes do Centrão calculam que, após o julgamento do STF, o ex-mandatário será pressionado a apoiar um nome, para evitar a fragmentação política da direita.