Notícias

Em entrevista ao GLOBO, o premiado arquiteto Francis Kéré fala sobre como vê o Rio daqui a 100 anos: cidade 'mais inclusiva, mais corajosa'

Vencedor do prêmio Pritzker de arquitetura de 2022, Kéré acredita que a cidade não precisa de grandes intervenções, mas de 'ações pequenas e precisas, como uma acupuntura urbana'

Por Agência O Globo - 27/07/2025
Em entrevista ao GLOBO, o premiado arquiteto Francis Kéré fala sobre como vê o Rio daqui a 100 anos: cidade 'mais inclusiva, mais corajosa'
(Foto: )

Nascido em Burkina Faso, na África Ocidental, Diébédo Francis Kéré é reconhecido por seu estilo pioneiro e único, com foco nos modos sustentáveis de construção. Em 2022, venceu o prêmio Pritzker, maior honraria da arquitetura mundial. Convidado a assinar o projeto da Biblioteca do Saber, na região portuária, visitou o Rio em maio. Em entrevista concedida ao GLOBO por e-mail, Kéré fala sobre como vê o futuro da cidade.

O Rio em cem anos:

Sua Majestade, o Rei dos buracos:

De que forma você imagina o Rio daqui a 100 anos?

Tive a oportunidade de conhecer diferentes partes do Rio e sentir sua vida cultural vibrante. Se eu imaginar essa grande cidade daqui a cem anos, quero que ela seja ainda mais inclusiva, mais corajosa, mostrando ao mundo um caminho em que a diversidade se torne um catalisador. Diante dessa diversidade incrível, espero que se torne um exemplo de cidade multicultural e multiétnica vivendo em harmonia. Um lugar para onde pessoas do mundo inteiro olhem em busca de inspiração. Para isso, precisa se tornar mais aberta, mais acessível. Imagino espaços públicos que transcendam os bairros, onde todos se sintam seguros para se encontrar, se conectar e pertencer.

Dada a complexa combinação de assentamentos informais, paisagens icônicas e áreas urbanas densas do Rio, que inovações você acredita que poderiam ajudar a cidade a evoluir de forma sustentável ao longo do próximo século?

Com a mistura complexa de assentamentos informais e áreas densas do Rio, a inovação mais importante é levar infraestrutura onde ela é necessária. Precisamos de vias, saneamento, espaços públicos seguros, para que as pessoas possam realmente se sentir em casa. Essas áreas precisam estar melhor conectadas ao restante da cidade, permitindo trocas, deslocamentos e oportunidades.

Os assentamentos informais precisam respirar. O planejamento urbano deve trazer frescor, segurança e identidade. Dar às pessoas orgulho do lugar onde vivem. Não são necessárias intervenções massivas, mas ações pequenas e precisas, como uma acupuntura urbana. Devemos encontrar uma maneira de desenvolver um sistema habitacional modular, simples e sustentável, que se encaixe na realidade dos assentamentos informais.

Ao longo do próximo século, as pessoas devem ter a chance de criar seus filhos sem medo, garantir seu sustento, celebrar quem são. Quando as comunidades prosperam, o Rio todo se fortalece.

Qual o papel da arquitetura na construção de um futuro mais inclusivo para metrópoles como o Rio?

A arquitetura pode ser um verdadeiro catalisador do desenvolvimento social. Quando as cidades são pensadas para empoderar as pessoas, elas se apropriam delas, protegem-nas, sentem que pertencem àquele lugar. Porque participaram da sua construção. Precisamos enxergar a arquitetura não apenas como edifícios, mas como um processo que fortalece as comunidades. Passo a passo, ao longo de cem anos, isso pode construir orgulho. Um orgulho que pode inspirar o Rio e muitas outras cidades ao redor do mundo.