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Artista americana descobre golpe após suposta compra de quadro por Lady Gaga; FBI investiga caso
Emma Webster acreditou ter vendido uma de suas pinturas à cantora pop; dois anos depois, a obra apareceu em leilão e ela descobriu ter sido vítima de um impostor.

A artista americana Emma Webster, de 36 anos, acreditou ter alcançado um novo patamar na carreira ao vender uma de suas pinturas para Lady Gaga. Mas a negociação, que parecia um marco profissional, acabou se revelando um golpe sofisticado de falsidade ideológica. Dois anos depois, a obra reapareceu em um leilão em Hong Kong, e o caso passou a ser investigado pelo FBI.
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Conhecida por criar paisagens a partir de imagens em realidade virtual, viveu uma reviravolta após receber um e-mail assinado com o nome verdadeiro de Lady Gaga, Stefani Germanotta. A mensagem, enviada de um endereço chamado [email protected], mencionava Koji, um dos buldogues franceses da popstar.
“Sou uma grande fã do seu trabalho”, dizia o e-mail enviado a Webster, baseada em Los Angeles. “Gostaria de saber se você tem alguma pintura disponível. Estou expandindo minha coleção, que é centrada em artistas mulheres poderosas como Kusama, Frankenthaler, Louise Bourgeois, Lynda Benglis e muitas outras. Seu trabalho a complementaria de forma encantadora! Seria muito especial. Muito obrigada e ansiosa para ouvir sua resposta, Stefani”.
Na época, em 2022, Webster havia acabado de ganhar notoriedade após três exposições consecutivas que resultaram em lista de espera pelas suas obras. O suposto interesse de Lady Gaga poderia alavancar ainda mais sua carreira. “Uau!”, respondeu a artista. “Muito obrigada pelas palavras gentis. Adoro uma coleção centrada no empoderamento feminino — e essas são nomes de peso!”
Em negociações de arte, aquisições costumam seguir protocolos rigorosos. Artistas e galerias priorizam colecionadores de prestígio e instituições. Isso ajuda a consolidar a trajetória e o legado do artista, além de evitar especuladores que compram obras apenas para revendê-las com lucro rápido.
Webster tinha poucas pinturas disponíveis, mas ofereceu Happy Valley, uma grande cena pastoral multicolorida, de aproximadamente 2x3 metros. O suposto interesse foi confirmado em nova mensagem: Stefani afirmou que gostaria da obra e pediu um desconto, que a artista concedeu, solicitando em contrapartida a confirmação de identidade.
“Muito amor é colocado no trabalho, e eu procuro ser cuidadosa com o destino das pinturas ao saírem do ateliê”, escreveu Webster. “Eu normalmente vendo para colecionadores que conheço pessoalmente. Você poderia, por favor, verificar sua identidade de alguma forma…? Empolgada para fazer parte da sua linda coleção de arte!”
A resposta veio acompanhada de uma selfie em que Lady Gaga aparecia em casa, usando suéter cinza, óculos pretos e argolas. “Aqui vai um registro rápido antes de cair na estrada!”, dizia o e-mail. “Vou viajar hoje à noite, mas minha querida assistente ficará de olho nos e-mails e cuidará dos pagamentos.”
O pagamento de US$ 55 mil foi realizado e a obra, despachada. Webster então escreveu: “Também peço, educadamente, que não revenda a pintura por cinco anos. Espero que esteja tudo bem — o mercado está louco com revenda de arte no momento.” Em tom descontraído, acrescentou: “Adorei os óculos, aliás!”
“Com certeza, NUNCA vou vender”, respondeu o contato.
O leilão
Dois anos depois, o pai de Webster se deparou com Happy Valley em uma postagem no Instagram da casa de leilões Christie’s, em Hong Kong. “Pronto para a maratona do mês de arte em Hong Kong? Para começar este mês empolgante na Christie’s, temos o prazer de apresentar um dos lotes mais fascinantes do nosso próximo Leilão Noturno Pós-Milênio — Happy Valley, de Emma Webster!”, dizia o anúncio.
O alerta levou Webster a questionar por que a pintura estaria sendo leiloada. “Pensei: ‘Por que diabos a Lady Gaga estaria leiloando essa pintura?’”, disse a artista, de 36 anos.
Havia indícios de que algo não estava certo. O comprovante de envio indicava armazenamento temporário, e o endereço do destinatário final, identificado como “Chris Horton”, suposto “gerente da casa”, não constava no documento. Ainda assim, Webster seguiu as orientações do suposto comprador. “Só para avisar, Emma, estamos prezando muito pela confidencialidade depois de alguns incidentes com entregadores no passado”, dizia o e-mail. “Então, por favor, não mencione meu nome quando falar com eles sobre a retirada ;) muito obrigada.” A artista respondeu: “Entendido!” e completou a entrega.
Após descobrir o leilão, Webster entrou em contato com o empresário de Lady Gaga, Bobby Campbell. “Receio que você tenha sido enganada por alguém que fingiu ser ela”, afirmou, em e-mail. “Ela não tem esse e-mail, nem temos um gerente da casa chamado Chris. Sinto muito que você tenha sido vítima desse golpe!”
Segundo apurou, a obra foi consignada à Christie’s por Matt Chung, galerista de Hong Kong. Webster pediu que a pintura fosse retirada do leilão, o que foi atendido, mas a devolução foi recusada. A Christie’s informou que manterá a obra até que a disputa seja resolvida.
— Conforme a política e como parte neutra, quando uma obra é consignada, somos obrigados a mantê-la em caso de questionamentos até que a situação se resolva — explicou uma porta-voz.
Chung afirmou que comprou a pintura por meio de John Wolf, consultor de arte de Los Angeles, e que também foi enganado. “Não tinha conhecimento de nenhuma atividade fraudulenta” e “também foi vítima dessa situação lamentável”, disse em e-mail à artista e ao advogado dela, Thaddeus Stauber. Para tentar resolver, ele ofereceu 30% do valor da venda em leilão, proposta que Webster recusou.
No mês passado, Chung abriu ação civil em Hong Kong, defendendo que tinha um contrato válido com a Christie’s e que a obra deveria ser devolvida a ele.
O advogado de Webster afirmou que a pintura foi denunciada como roubada e que o FBI investiga o caso. A agência não comentou.
— Proteger os artistas de pessoas mal-intencionadas no mercado é um esforço importante — disse Stauber: — Quando alguém trai a confiança que os artistas depositam nos colecionadores, isso causa um grande prejuízo.
Luke Nikas, advogado especializado no mercado de arte, explicou que a lei americana trata a personificação com intenção de obter vantagem como contravenção penal.
— É muito importante que os artistas possam ter algum grau de controle sobre seu mercado — afirmou: — Os artistas escolhem cuidadosamente quem querem que sejam seus colecionadores, para construir o mercado do jeito certo.
Procurado por telefone, John Wolf admitiu ter vendido a pintura a Chung, mas negou ter comprado diretamente de Webster.
— Nunca estive envolvido em uma compra direta dela. Isso é completamente inesperado — disse.
A situação era impensável para Webster, que começou a carreira dormindo em um estúdio-garagem e tomando banho na academia. Nascida em 1989, na Califórnia, ela se formou em Stanford em 2011 e concluiu mestrado em pintura na Universidade de Yale em 2018. Sua trajetória mudou depois que uma consultora a apresentou à galerista Alice Lung, da Perrotin, que a convidou para a exposição inaugural da filial em Seul.
O evento teve boa repercussão. “Ver as obras de Webster é se imergir em novos mundos”, escreveu a ArtNews. “Suas pinturas são vividamente assombrosas, apontando tanto para a beleza da natureza quanto para a destruição causada pela humanidade.” Na mesma época, um curta documental da atriz Emma Watson ajudou a impulsionar seu reconhecimento.
Pouco depois, chegou o e-mail de “Stefani Germanotta” manifestando interesse por seu trabalho.
— Eu nunca imaginei que alguém precisaria fingir ser uma popstar só para ter acesso a uma das minhas pinturas — disse Webster.